2024-03-11

Pagamento por serviços ambientais: incentivo poderoso para uma transição justa e baseada na Natureza

Remunerar por serviços ambientais é uma saída ecossistêmica e economicamente eficaz para combater o aquecimento global e promover desenvolvimento socioambiental

Marco Dorna, presidente da Tetra Pak Brasil

Marco Dorna* 

Publicado originalmente no broadcast do Estadão**

Para ativistas, cientistas e especialistas, a discussão sobre a forma e a eficácia dos chamados pagamentos por serviços ambientais (PSA) no combate ao aquecimento global já está no radar há tempos. E fato é que agora o tema entrou de vez na agenda corporativa como uma ferramenta que promete ser ao mesmo tempo importante para os negócios e relevante para a sociedade. 

Sei que é muito mais fácil escrever sobre serviços ambientais do que de fato tirar projetos do papel. Se a teoria já é difícil, a prática se mostra muito desafiadora. Mas, assim como aprendemos nos negócios, cabe a nós experimentar com certa dose de ousadia.  

A compensação ou pagamento por serviços ambientais é um mecanismo que remunera pessoas ou organizações que trabalhem, por exemplo, com conservação de florestas, assim como restauração e recuperação de áreas e de proteção da biodiversidade. Em grande medida, a ferramenta vem apoiar projetos baseados na Natureza, a fim de garantir benefícios que a nossa “Mãe” proporciona, como comida, água, madeira, fibras, manutenção da biodiversidade, regulação do clima, proteção contra inundações, etc. 

No final de 2023, foi aprovado no Brasil o Projeto de Lei que criou a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais, que ainda está em fase de regulação envolvendo um Grupo de Trabalho (GT) criado pelo governo federal para analisar detalhes do projeto. Entre outros, há solicitações de que sejam ouvidas as populações envolvidas no PSA, como as comunidades tradicionais, os povos indígenas e os agricultores familiares.  

Enquanto essas regulamentações não saem no papel, já existem movimentos de organizações, de governos regionais e até de empresas para criar projetos com pagamentos por serviços ambientais como pilar central. Em primeiro lugar, é importante colocar que o PSA deve ser considerado um meio, e não um fim em si mesmo. Não se trata de um mecanismo de transferência de rendas, mas de um poderoso incentivo voluntário capaz de sustentar ações práticas com impactos reais mensuráveis e observáveis na ponta.  

As vantagens deste mecanismo são enormes. Para produtores e proprietários, ele representa um fluxo de receitas novo e menos volátil que a conhecida roda das commodities. Ao apoiar restauração e preservação ambiental, uma série de novas oportunidades se abrem, como a potencial venda de créditos de carbono e a atuação consciente ligada à bioeconomia e ao ecoturismo. Isso mantendo apenas o aspecto financeiro da causa, sem falar dos resultados positivos por si só gerados pela preservação ambiental e as inúmeras externalidades positivas geradas ao longo do caminho nas comunidades ao redor. 

E talvez aqui esteja o ponto fundamental de discussão: qual seria o valor justo e economicamente adequado de um serviço ambiental?  

Infelizmente, este curto artigo não dará conta de tamanho dilema, e orgulhosamente me coloco aqui na posição de aprendiz. O tema é vasto, assim como é enorme a gama de particularidades que cercam cada projeto ou região, de modo que não parece viável pensar em uma receita aplicável a todos os casos. Cada ator em cada setor tem um entendimento sobre o valor do seu trabalho.  

Mas ouso dizer que, no que diz respeito aos projetos do setor privado baseados na prestação de serviços ambientais, os valores e o tempo dos projetos serão tão relevantes quanto o tamanho do real comprometimento de empresas e organizações com suas metas de descarbonização e sua verdadeira preocupação com a biodiversidade e ecossistemas. 

E tudo isso mesmo diante de algumas especificidades, como a concorrência que projetos envolvendo PSA têm diante de atividades que podem ter preços mais atraentes, como culturas de soja e milho. Mas eu entendo que um não exclui o outro. Ao contrário, podem e devem se complementar porque os benefícios sociais, financeiros e ambientais de autoalimentam.

O sistema Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), cuja técnica e retornos já são conhecidos, pode servir de inspiração às atividades com PSA, uma vez que as diversas pontas envolvidas estão conectadas e a preservação ambiental e o cuidado social andam de mãos dadas com a atividade econômica.

Acredito também que o mercado determinará os rumos futuros dos preços, seja pela evolução dos marcos regulatórios ou como forma efetiva de respostas às demandas dos consumidores e clientes, que tendem a continuar mais exigentes, com preocupações socioambientais cada vez mais apuradas. 

A lição: pagar por serviços ambientais é uma saída ecossistêmica, social e economicamente eficaz para combater o aquecimento global e promover desenvolvimento socioambiental. A oportunidade que se apresenta a todos nós é a da busca de agregação de valor às cadeias produtivas por meio de incentivos que apoiem pessoas e planeta a uma só vez.  

 

*Marco Dorna é presidente da Tetra Pak Brasil.