2024-05-16
A economia circular entra como uma ferramenta eficiente para mudar essa estrutura. Ou seja, precisamos criar, expandir e fortalecer alicerces que garantam a recuperação e a manutenção de produtos e de recursos pelo maior tempo possível e de forma sustentável.
Quem nunca ouviu de alguém que, no Brasil, algumas leis “pegam” e outras “não pegam”? São dizeres que saem sem pensar, eu acredito, porque leis são feitas para “pegar”, quer goste ou não uma parte da população, já que passam por todo um processo democrático e legítimo quando são criadas.
Mas sei também que, em alguns casos, leis importantes demoram mais do que deveriam para sair do papel e terem sua efetividade colocada à prova. Falta de prioridade, eu diria, tanto por parte de agentes públicos quanto privados, como é o caso da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei n° 12.305, de 2010), importantíssima no combate ao aquecimento global porque envolve ações que levam a esses resultados, como reciclagem e uso de resíduos para geração de energia.
As mudanças climáticas vêm ganhando corpo a olhos vistos nos últimos anos e têm a capacidade de afetar o dia a dia da população mundial e, consequentemente, economias e negócios. Exemplo é a tragédia que afeta o Rio Grande do Sul neste momento, com enchentes históricas, além de incêndios na Amazônia.
Um pouco de história. A PNRS foi criada em 2010, depois de intensos debates sobre responsabilidades com o lixo produzido. Quem ficaria encarregado por dar tratamento aos resíduos sólidos produzidos por todos nós? Quanto isso custaria? Ao fim, foi construído um texto que merece aplausos por ser adequado e que determina a responsabilidade compartilhada de todos os atores envolvidos na cadeia de produção, consumidores e governos.
Mas o decreto que regulamentou a política veio só 12 anos depois de a lei ser votada, criando o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares), com diretrizes, estratégias, ações e metas para modernizar a gestão de resíduos sólidos no país. Ele prevê o fim de todos os lixões, além do aumento da recuperação de resíduos sólidos para cerca de 50% em 20 anos, o que significa que metade do lixo gerado deverá ser reaproveitado por meio da reciclagem, compostagem, biodigestão e recuperação energética. Segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão de Resíduos Sólidos (Sinir) do Ministério do Meio Ambiente, apenas 2,2% dos resíduos sólidos urbanos no Brasil são reciclados.
Neste período, vimos uma lenta evolução da infraestrutura dos municípios e não cumprimento de metas parciais de fechamento dos lixões, por exemplo. Mas isso não significa que nada foi feito. Posso citar a Coalizão Embalagens, criada em 2012 e que reúne atualmente 8 organizações representativas do setor empresarial de embalagens que criou acordos para atender a PNRS. Mas, assim que criada, a própria Coalizão tinha cerca de 20 entidades, mais um sinal de que tratar sobre esse tema não “pegou” como deveria.
Sabemos que o modus operandi do atual sistema econômico linear está perto do esgotamento, para não dizer já saturado, e é aí que a economia circular entra como uma ferramenta eficiente para mudar essa estrutura. Ou seja, precisamos criar, expandir e fortalecer alicerces que garantam a recuperação e a manutenção de produtos e de recursos pelo maior tempo possível e de forma sustentável.
E isso vale para toda a cadeia de valor de cada setor e empresa, ou seja, que esses alicerces estejam estabelecidos para fornecedores, clientes e consumidores. E por que não dizer também fazendo parte de novas e atuais políticas públicas com esse fim.
O ponto de partida já está dado e regulamentado. A PNRS indica soluções e ações que podem levar a resultados positivos diante do cenário que enfrentamos no momento, de baixa demanda por materiais recicláveis e falta de destinação adequada dos resíduos sólidos, mas temos de fazer nossa parte. Uma delas é aumentar o consumo de materiais reciclados nas diferentes etapas da cadeia de valor para que, enfim, estas ações saiam do papel. Além, é claro, de avançar com investimentos em pesquisa e inovação
A reciclagem faz parte dessa roda sustentável que deve ser colocada para girar de forma urgente e, por isso, quero aproveitar esse espaço de coluna para continuar trazendo informações e provocações sobre o tema, tão caro hoje em dia para qualquer empresa minimamente preocupada com o meio ambiente e consequências do aquecimento global.
Por isso, nos próximos artigos, vou conversar aqui sobre a importância fundamental dos catadores --autônomos ou organizados em cooperativas-- educação ambiental, entre outros.
Há muito trabalho a ser feito e o setor privado pode ter um papel passivo de compliance legal ou pode ter protagonismo nesta mudança estrutural que envolve não apenas a iniciativa privada, mas o poder público e a sociedade.
*Marco Dorna, Presidente da Tetra Pak Brasil.